22.12.16

2016 na verdade foi maravilhoso

Acho que faz mais de 10 anos que eu escrevo posts sobre o fim do ano, fazendo um grande apanhado de tudo que aconteceu. Esse ano vira com mercúrio retrógrado, então é ainda mais propício para a reflexão. Todo mundo está dizendo que 2016 foi uma merda, mas para mim, sinceramente, foi o melhor ano da minha vida. Ano passado meu arcano foi o Heremita invertido. Eu sairia da minha toca. E saí mesmo. Vamos ver o que o ano que vem vai trazer.

Eu comecei saindo de um emprego que eu odiava para ir para outro em que eu ganharia melhor. Acabou que o emprego novo era bem ruim também, mas conheci pessoas incríveis, aprendi meus limites e consegui juntar algum dinheiro. Terminei meu mestrado enquanto trabalhava no segundo emprego que sugava minha alma, publiquei minha dissertação que tem capa e tudo como um primeiro livro. Chorei igual uma idiota na gráfica.

Defendi meu mestrado e descobri que deveria ter seguido com minhas ideias originais. Peguei meu diploma semana passada. Entrei para um curso de escrita criativa que era uma coisa que eu sempre quis fazer. Aprendi a seguir minha intuição e a confiar mais em mim mesma. Aprendi a ter coragem de finalmente me assumir como artista em vez de só dizer que às vezes eu escrevo umas coisas e faço uns filmes de vez em quando. Conheci pessoas incríveis que vou levar pra vida inteira. Finalmente encontrei minha turma.

Depois de decepções desde 2014, lancei minha primeira websérie com amigos incrivelmente talentosos. Nunca tive tanto orgulho de uma direção de arte que eu mesma fiz. O Dilemas de Gente Branca ficou melhor do que imaginava que ficaria e isso nunca acontece. Sobrevivemos por 6 meses e ainda temos episódios arquivados. 26 fucking episódios. Vinte e seis. É uma temporada inteira de Friends.

Comecei a escrever uma newsletter das coisas que eu fiz e das coisas que encontrei por aí. Escrevi muitas matérias sobre mulheres incríveis no Minas Nerds. Fiz dois zines. Um meio bosta com um conto antigo, outro dobradinho e mais lindinho de poesias. Fiz dois lambes com poemas meus. Vendi minhas coisas em feiras de publicações independentes. Quis abraçar todo mundo que comprou minhas coisas. Colaborei com muita gente talentosa. Tive coragem de mandar minhas histórias para revistas e concursos e editoras.

Viajei para Nova Iorque com minha irmã. Fez muito calor, fomos nos museus dos meus sonhos, vimos um musical na Broadway, comi um montão de bagels, fomos no maior museu de miniaturas de trem do mundo, passamos Shabbat em uma sinagoga, assistimos uma luta de UFC em um sportsbar kosher no Brooklyn, vimos uma cantora lírica cantando no Central Park, fugimos de um bêbado no metrô, nos perdemos muito porque eu não sei ler mapas, agradeci aos céus porque minha irmã sabe ler mapas, conheci o bebê mais lindo do mundo, fiquei com vontade de ter uma sobrinha e andamos até ficarmos exaustas.

Me apaixonei, tive meu coração partido. Chorei por quase dois meses. Tive o melhor relacionamento da minha vida, o mais honesto, o mais carinhoso, o mais livre, o mais estimulante.

Tirei os sisos, tirei os pólipos de dentro do nariz, não tive que fazer a terceira cirurgia por um milagre da natureza. Minha cabeça parou de doer, consigo abrir bastante a boca agora, consigo respirar melhor, minha voz está mais bonita. Parece que deixei tudo que me segurava para trás.

Escrevi um livro. Escrevi um fucking livro de 95 páginas. Um livro de 95 páginas que fez as pessoas chorarem e terem pesadelos e me adicionarem no Facebook sem saber quem eu sou. Finalmente acredito que sou, sim, boa o suficiente.

Comprei um sem número de roseiras. Algumas caíram da janela, outras morreram. A última, da cor certa, do tamanho certo, finalmente pegou. Só falta voltar a dar flores.

Comprei uma caralhada de livros novos. Peguei outros emprestados. Li vários autores novo. Alguns entraram na lista de preferidos.

Vi meu primo casar depois de 12 anos, vi minha irmã experimentar seu vestido de noiva, vi meu irmão se tornar médico.

Aprendi a pedir e a aceitar ajuda. Sempre que eu precisei de dinheiro, o dinheiro veio.

Voltei a gostar de fotografia.

Ontem fiz o meu primeiro esfoliante caseiro.

Foi um ano do caralho.

19.12.16

Carregue meu Cadáver - Capítulo 47

Gabriela achava irônico quando o dia estava tão bonito em ocasiões tão tristes. Queria que estivesse frio, nublado e chuvoso, para combinar com seus trajes pretos e sua desolação.

Taís tinha um buraco na boca do estômago do tamanho de Ana. Não sabia bem o que fazer com aquilo, mesmo depois de meses sentindo tantas coisas diferentes.

Paulina chorava alto do outro lado do caixão. Segurava um lenço de papel e soluçava como se não admitisse que mais ninguém sentisse sua tristeza.

A família teve o bom senso de enterrar Ana em um caixão fechado. O funcionário da funerária tinha dito para a família que nada que ele fizesse conseguiria disfarçar o estado avançado de putrefação em que o corpo de Ana tinha sido encontrado. Isso sem contar as marcas de mutilação e abuso.

O coveiro jogou a primeira pá de terra fresca sobre o caixão.

– Minha filha! Minha pobre filha!

Paulina gritava. Com as mãos em seus ombros, seu marido olhava o caixão atônito, como um homem morto, incapaz de proteger sua família.

Gabriela esticou a mão para segurar a mão de Taís. Taís a puxou para um abraço. Pela primeira vez em meses, ela finalmente começou a chorar.

– É tudo culpa nossa, Gabi.

Taís soluçava e seu corpo inteiro tremia.

– Se a gente não tivesse panguado e enrolado tanto tempo, a Ana nunca estaria nesse estado.

Gabriela não conseguiu responder. Acariciou as costas da amiga e molhou seu cabelo com as próprias lágrimas.

O som molhado de terra macia caindo sobre madeira se perpetuou pelo cemitério plano. A cada batida, a certeza de que a amiga jamais retornaria se tornava mais palpável.

Depois de estações inteiras, Taís levantou a cabeça do ombro da amiga e secou os olhos com as mãos.

Do outro lado do gramado e atrás das poucas pessoas que sobraram ao redor do caixão estava Antonio.

Parecia deslocado, segurando um bouquet de damas da noite na mão esquerda e compulsivamente fumando um cigarro com a direita.

– Não acredito que ele tá aqui.

Taís soltou Gabriela. Gabriela enxugou os olhos e se virou devagar. Como ele tinha coragem?

As botas de Taís pisavam pesadas sobre a grama verde.

– Como você ousa?

Antonio olhou para o chão.

– Eu a amava muito – disse, baixinho.

Taís sorriu com um lado só da boca. Gabriela veio andando atrás dela com os punhos fechados.

– Você é a pior pessoa do mundo, Antonio. – disse Taís – Você conta uma mentira como se fosse uma verdade.

Taís tomou a mão de Gabriela e a levou para fora do cemitério. Os últimos convidados do enterro retiravam-se devagar. O coveiro apertou a terra sobre o caixão.

Antonio permaneceu sozinho no cemitério com seu cigarro, suas damas da noite e Ana, trancada em uma caixa de madeira a sete palmos do solo, onde Antonio não conseguiria mais tocar nela.

Fazia um lindo dia de sol.



Esse é o capítulo final de Carregue meu Cadáver, o livro que estou escrevendo sobre relacionamentos abusivos. Vou postar um capítulo por dia até acabar.
Adoraria saber sua opinião, então deixe um comentário me dizendo o que achou, divida com quem você acha que vai gostar e me cobre se eu parar de postar.

Obrigada!

Capítulo 1Capítulo 2Capítulo 3Capítulo 4Capítulo 5Capítulo 6Capítulo 7Capítulo 8Capítulo 9Capítulo 10 • Capítulo 11 • Capítulo 12 • Capítulo 13 • Capítulo 14 • Capítulo 15 • Capítulo 16 • Capítulo 17 • Capítulo 18 • Capítulo 19 • Capítulo 20 • Capítulo 21 • Capítulo 22 • Capítulo 23 • Capítulo 24 • Capítulo 25Capítulo 26 • Capítulo 27 • Capítulo 28 • Capítulo 29 • Capítulo 30 • Capítulo 31 • Capítulo 32 • Capítulo 33 • Capítulo 34 • Capítulo 35 • Capítulo 36Capítulo 37 • Capítulo 38 • Capítulo 39 • Capítulo 40 • Capítulo 41 • Capítulo 42 • Capítulo 43 • Capítulo 44 • Capítulo 45 • Capítulo 46

15.12.16

Carregue meu Cadáver - Capítulo 46

Taís sabia que seu maior arrependimento da vida viria de abrir a porta, entre a cama e a escrivaninha.

Taís segurou a mão de Gabriela e abriu a porta.

Taís e Gabriela levaram meses para conseguir voltar a dormir. Todas as noites depois daquela, elas alternavam entre quem acordava suando frio e sem fôlego. A imagem ficou gravada a lâmina de barbear no fundo de seus olhos. Era diferente dos filmes que as meninas assistiam escondidas de madrugada. Diferente dos livros de zumbi. Diferente de todos os jogos.

Antonio atravessava Ana como uma estaca. A puxava para perto de si ritimamente em um ritual fúnebre. Taís sentiu seu próprio corpo ser violado. Gabriela gritou para manter seu estômago no lugar, que insistia em escapar pelo esôfago. Só então Antonio parou o que estava fazendo. Não amoleceu.

De trás da porta, Paulina empurrou as meninas abrindo caminho para a banheira. Dona Bete vinha logo atrás dela, agarrada às beiradas da sua blusa vermelha, arranhando seus braços.

Paulina empurrou Antonio para longe do cadáver da filha. Levantou seus restos da banheira. Ajoelhou-se no chão com o corpo putrefato. Não parava de gritar.

– Minha filhaaaaa! Minha pobre filhaaaa!!

Dona Bete empurrou o filho para o quarto, o obrigou a fechar as calças. As meninas se afastaram de Paulina, dando-lhe espaço. Gabriela tremia como um galho seco em meio à tempestade. Taís segurou a mão de Gabriela. Se posicionou em frente à porta para velar o luto de Paulina.

Não amoleceu.


Esse capítulo faz parte de Carregue meu Cadáver, o livro que estou escrevendo sobre relacionamentos abusivos. Vou postar um capítulo por dia até acabar.
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14.12.16

Carregue meu Cadáver - Capítulo 45

Dona Bete desceu as escadas de dois em dois degraus. Precisava proteger o filho. Precisava. Atrás dela, Paulina descia as escadas escuras com dificuldade, apoiando-se no corrimão. Ameaçava Dona Bete com todo o seu dinheiro e seus advogados. Dona Bete também tinha advogados. Todos da sua família eram advogados. O único defeito do filho era não ter sido advogado.

Dona Bete colocou a mão na maçaneta. Paulina forçou seu braço e abriu a porta com força, deixando uma marca profunda no braço de Dona Bete.

– Esse quarta tá um nojo. - disse Paulina - Até parece que seu filho não tem mãe.

– E cadê a mãe que nunca veio buscar a filha que divide o nojo do quarto?

Paulina nunca tinha batido em ninguém além dos próprios filhos.


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13.12.16

Carregue meu Cadáver - Capítulo 44

Gabriela e Taís desceram as escadas para o porão. A cada degrau, o cheiro ficava mais forte. Cheiro de suor e porra, de lençóis que nunca são trocados, louça suja de dias sem voltar à cozinha. Era o cheiro do armário do meio-irmão de Gabriela, o cheiro que ele ficava quando voltava do futebol. O cheiro que mais tarde ela reconheceria quando recebesse homens em casa.

Taís puxou a porta para dentro tentando não fazer barulho. Ouvia-se baixinho um rock alternativo triste que as meninas sabiam que Ana nunca gostou.

O quarto era pequeno. Uma cama bagunçada, roupas jogadas pelo chão e uma toalha molhada em cima dos lençois sujos. Um armário abarrotado e uma escrivaninha cheia de papéis, pratos sujos, uma TV e alguns livros jogados. Não passavam de vinte livros. Dostoievskis e Schopenhauers sem ler, Machados e João Ubaldos marcados a caneta. Um Mein Kampf disfarçado entre os papéis.

Colado na parede, as meninas reconheceram o traço de Ana. Era um desenho do casal datado do início do relacionamento. Dava para reconhecê-los pelas roupas. Mesmo no desenho, Ana estava triste. Era o único resquício dela pelo quarto.


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9.12.16

Carregue meu Cadáver - Capítulo 43

Dona Bete sabia o que tinha que fazer agora. Tinha que tirar aquele monte de mulher histérica da sua casa, de cima do seu pimpolho. Não sabiam que era falta de educação vir entrando assim, dentro da casa de alguém, dando ordens?

Dona Bete viu as meninas descendo as escadas. Ela sabia bem para nunca descer até o porão do filho. Antonio detestava sem incomodado. Umas intrometidas, isso depois de revirarem sua casa inteira. Se elas sumissem, tinha certeza de que suas mães só perceberiam depois de muitos meses. Igual essa velha louca que não parava de gritar. Se é que tinham mães.

Dona Bete sabia, é claro, que Ana estava lá. É claro que sabia. Estava lá há meses. Só não sabia em que estado. Nunca mais subia para comer, não saía mais de casa, Antonio nem levava comida para ela. Tinha até um pouco de medo do que as meninas descobririam.

Mas a sua parte ela fazia. Cuidava do filho. E essa era sua missão na terra: cuidar da sua prole. Proteger seu menino tão sensível de todos os males do mundo. Até de si mesmo.


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8.12.16

Carregue meu Cadáver - Capítulo 42


– Onde está minha filha, sua bruxa? - disse Paulina, que nunca conseguia manter a voz calma.

– Quem é sua filha? - dona Bete respondeu. - Pensei que a menina que estivesse aqui nem tivesse mãe.

– Eu sei que minha filha está aqui.

– Ela está aqui há meses. Como é que você só se interessou em vir agora? 

Taís puxou Gabriela pelo braço. Enquanto as adultas trocavam insultos, elas precisavam encontrar Ana.

A casa era maior do lado de dentro do que parecia do lado de fora. Gabriela evitava pensar em como poderiam encontrar a amiga. Enfiada em qualquer armário, embaixo de alguma cama, em pedaços dentro de uma cômoda aleatória.

Abriram cada porta de cada móvel dentro de cada quarto. Os berros de Dona Bete e tia Paulina ressoavam da entrada da casa enquanto defendiam suas crias. Como qualquer outra mãe, Taís sabia, estavam apenas defendendo seu próprio orgulho.

Ana tinha que estar na casa. Tinha que estar.

– Será que ele se livrou dela? - disse Gabriela, exausta de tanto procurar fantasmas.

Taís indicou a escada para o sótão.
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7.12.16

Carregue meu Cadáver - Capítulo 41

Gozar entre seus seios sempre foi um prazer especial. Abrir caminhos, preencher buracos. O sexo depois da briga tinha que ser ainda mais especial. Antonio se empurrou sobre o esterno de Ana. Forçou-se na carne frágil, entre as costelas. Queria entrar nela, como nunca tinha entrado. Abrir a pele, meter entre as fibras da carne.

– Eu te amo, Ana.

Puxou seu corpo endurecido para frente e para trás sobre seu próprio corpo, as pernas ainda mergulhadas no formol. A cabeça pendia para trás, a boca aberta, seus olhos ocos encarando o teto do banheiro.

Esfregou o pau no seu coração murcho, deslocou seus pulmões e seu fígado. Despedaçou seus órgãos internos podres com a intensidade de seu desejo.

– Nunca vou te abandonar, Ana. Nunca.

 
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6.12.16

Carregue meu Cadáver - Capítulo 40

– O Google disse que é essa casa aqui, tia. - disse Gabriela.

As horas e horas que Gabriela passava no celular finalmente tinham valido a pena. Cruzando os dados de todos os traços virtuais de Ana, tinha conseguido mapear o que ela acreditava ser a casa de Antonio.

Ela e Taís estavam nervosas. Paulina estava lívida. Como sempre, as mulheres estavam munidas apenas da própria coragem.

Bateram na porta.

Silêncio.

Tocaram a campainha.

A grama ao redor da casa secou enquanto esperavam do lado de fora.

Paulina tocou a campainha insistentemente.

A porta se abriu.

Gabriela desejou muito que a senhora que tinha acabado de abrir a porta limpasse a maquiagem azul borrada abaixo dos olhos.

– B-boa tarde? - disse a senhora.

– É aqui que mora o Antonio? - perguntou Paulina, como uma general do exército sem paciência depois de ver mil de seus homens morrerem em batalha.

– O que vocês querem com meu filho? - respondeu Dona Bete.


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5.12.16

Carregue meu Cadáver - Capítulo 39

Os dias foram passando até que Antonio não conseguiu mais ignorar a presença pungente de Ana na sua banheira de formal. A culpa por tê-la abandonado pesava como uma estátua fúnebre sobre seus pulmões. Ele se ajoelhou ao lado da banheira e desenhou círculos na superfície do formol. A carcaça de Ana boiava tranquilamente, suas mãos a centímetros dos dedos de Antonio.

Antonio respirou profundamente, dono de todo o tempo do mundo.

– Desculpa ter te abandonado, Ana - ele disse, devagar, segurando a mão morta da garota - Foi o que eu precisava fazer.

Antonio nunca tinha se sentido tão sozinho na presença de Ana. Era como se ela nem estivesse lá.

– Me desculpe - ele insistiu - Por favor.

Antonio virou o corpo dentro da banheira. Ele removeu delicadamente os fiapos escassos de cabelo que envolviam seu rosto. Olhou profundamente nos buracos onde estiveram seus olhos.

– Estou com saudades, Ana.

A pele de Ana estava toda cinza e enrugada, repuxada sobre a carne que quase não existia mais.

Antonio a puxou para fora da banheira e a envolveu em seus braços. Sentiu a memória do cheiro de sol em seus cabelos, a memória de sua pele quente e o toque dos seus seios que um dia foram tão macios.

Antonio tirou sua blusa devagar.

– Como eu pude te abandonar, Ana?

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1.12.16

Carregue meu Cadáver - Capítulo 38

 – Não acredito que seu pai não acreditou em você - disse Taís.

– Ele nunca acredita - respondeu Gabriela.

– E a tia Paulina?

– Ficou louca. Disse que era caso de polícia.

– Ainda bem que a gente tá aqui.

Taís tomou um gole da água morna do copo de plástico frágil, com cuidado para não amassá-lo e molhar toda a roupa. Era engraçado como órgãos públicos pareciam sempre estar uma década atrasados. As divisórias brancas, os telefones fixos, as impressoras barulhentas. Taís achou até que tinha ouvido um fax. Gabriela se acomodou melhor no banco de espuma.

– Será que ainda vai demorar muito?

As meninas logo viram Paulina, ainda mais alterada que o normal, saindo do escritório acompanhanda de três policiais. Um homem fardado segurando cada um de seus braços, a forçando para o corredor. O terceiro policial, de terno, falava com voz mansa:

– Mas, senhora, eu já te expliquei, nós não podemos fazer mais nada.

– É assassinato! Agressão! Lei Maria da Penha! - Paulina era incapaz de manter o tom de voz baixo mesmo em dias comuns. - Vocês precisam me ajudar!

– A senhora já preencheu o B.O. Nem soube nos dizer um endereço ou a data. Nós prometemos fazer o que for possível.

– É minha filha!

– Com todo o respeito, minha senhora, o que você acha que ela pode ter feito para que ele tivesse que fazer isso?

– Que diferença isso faz? - interveio Taís, do outro lado da delegacia.

Os policiais soltaram Paulina no corredor.

– Tenha um bom dia, senhora. - disse o policial sem farda, ignorando Taís. - E que Deus a proteja.

– Pelo menos ele, né?

Paulina pegou as duas meninas pelo braço e as arrastou para fora do prédio. Gabriela sentiu as unhas da mulher enterradas em sua pele, seus batimentos cardíacos pulsando nos dedos.

– Esses homens nunca vão ajudar a gente.

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