27.9.08

eram telefones velhos, celulares, baterias, máquinas fotográficas, filmadoras, torradeiras, microondas, impressoras, geladeiras e pedaços de computadores que formavam os escombros. o tom variava de verde-musgo a preto acinzentado. o tipo de cor que não se fixa, que não pode ser propriamente nominado. as formas eram quebradas. não havia nada seco, nem completamente molhado. tudo estava úmido. o ar, o metal que cobria o chão, os canos que traziam a água. não havia musgo. não havia ratos. não havia baratas. não havia nada.

as televisões, ora sobre os montes de lixo de gerações inteiras, ora em meio aos escombros, empilhados e encaixados desordenadamente, soltavam luzes vermelhas, azuis, que piscavam repetidamente, falhando sempre, mas perseverando sempre. era a única fonte de luz, que mudava a cor do entulho, enquanto se alterava. cores frias, mesmo quando era vermelho, refletia a mensagem fria do homem que ainda mandava na (des)terra. era uma gravação. nem o homem existia mais. estava morto. todos estavam mortos.

entre tudo aquilo, um ser distante. disforme, muito pálido, braços e pescoço magros em demasia, corcunda. sem olhos. não precisava deles naquele mundo sem luz. a boca era um rasgo no meio da face sem menor expressão, lisa. se achava no meio da celeuma tateando, sentindo o que já sabia. explorava na escuridão de sua (in)existência.

sabia que havia algo mais. sabia que deveria haver. não encontrava. não ouvia os ruídos dos milhares de televisores. não via as cores que elas proporciavam. não sabia o que eram cores. construia noções vagas do que seriam os escombros táteis em sua mente sem muita imaginação. comia arame, aço, a não-vida.

rodou todo o mundo buscando algo. qualquer coisa.

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